Publicado em 29/03/2022 12:46 Última edição 29/03/2022 12:46

Após recorde em fevereiro, arrecadação será impactada por desonerações

Fonte: O Globo

Após recorde em fevereiro, arrecadação será impactada por desonerações

A arrecadação federal em fevereiro de 2022 somou R$ 148,664 bilhões, de acordo com dados da Receita Federal. O número registra um avanço de 5,27% em relação ao mesmo mês do ano anterior, já descontada a inflação do período.

Esses números ainda não refletem as medidas tributárias anunciadas pelo governo no início desse ano, como as reduções de alíquotas de alguns tributos, como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), PIS/Cofins que incide sobre combustíveis, Imposto de Importação (II) e IOF. O Fisco admite que a tendência é de que essas medidas diminuam a arrecadação.

O chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros da Receita Federal, auditor-fiscal Claudemir Malaquias, pondera que a atividade econômica determina o desempenho da própria arrecadação e as mudanças adotadas pelo governo devem diminuir a arrecadação:

— Todas as medidas anunciadas foram medidas que desoneram a carga fiscal, ou seja, desoneram o contribuinte do pagamento de impostos. Essas medidas reduzem a carga tributária e, consequentemente, tendem a reduzir a arrecadação. Vamos aguardar o início da vigência para verificarmos o comportamento dos contribuintes.

Malaquias explicou que o resultado de fevereiro majoritariamente reflete fatos ocorridos em janeiro, então ainda haverá um período para o Fisco observar os efeitos das medidas adotadas pelo governo. Ele lembrou que no passado, a redução de alguns tributos chegava a provocar aumento da arrecadação pelo incremento da atividade econômica, mas que ainda é cedo para avaliar os impactos dessas novas medidas.

— Em linhas gerais, em termos grosseiros e à primeira vista, todas as medidas são de desoneração e então o impacto será de redução da carga tributária — reiterou.

Desde 2021, a arrecadação federal vem batendo recordes e o governo sustenta que esse aumento é estrutural, a despeito da preocupação com que alguns analistas veem esse cenário.

Com esse aumento da arrecadação, o governo está promovendo ajustes em alguns tributos, sobretudo para ajudar na queda da inflação, cujo índice acumulado em 12 meses ultrapassa os dois dígitos.

Na última semana, o governo zerou, até o fim deste ano, o imposto de importação sobre o café, a margarina, o queijo, o macarrão, o óleo de soja e o açúcar. Também foi zerado o imposto de importação do etanol, que é misturado na gasolina e também vendido separadamente.

Para Juliana Damasceno, analista sênior da Tendências Consultoria e pesquisadora do Ibre/FGV, as medidas tributárias adotadas pelo governo no esforço anti-inflacionário são tomadas pelo lado da receita, quando se pode contar com fontes extraordinárias.

— Abrir mão de uma receita que surpreende de forma positiva é bem menos demandante do que gastar, ou entrar no dilema de ampliar gastos tendo teto de gastos — avalia, lembrando que há margem para essa redução por algumas razões, como os efeitos diretos da alta do preço do petróleo, que influenciam tanto no recolhimento de royalties como de forma disseminada pelo efeito da inflação na economia.

Na avaliação da economista, o desempenho positivo da arrecadação não é estrutural:

— Quando a gente olha o desempenho da arrecadação, a gente consegue ver que são os motores conjunturais que continuam no comentado. Não há indícios de uma recuperação estrutural. A gente vê que a produção industrial assim como a venda de bens continuam em queda, mas tem recorde de arrecadação, e em movimento contrário aos resultados negativos desses setores.

Para ela, a preocupação que fica é como as medidas tributárias que são adotadas pelo governo agora, e que vão repercutir na arrecadação, serão "tiradas de cena" quando não houver um movimento favorável de fatores conjunturais, como a alta de commodities e a inflação acelerada.

Melhor desempenho para o mês

Os dados da arrecadação de fevereiro foram divulgados nesta segunda-feira. De acordo com o Fisco, esse é o melhor resultado para o mês desde 1995. Nos dois primeiros meses deste ano, a arrecadação federal somou R$ 359,6 bilhões, registrando avanço real de 9,85% ante o primeiro bimestre de 2021.

Segundo a Receita, o aumento neste período pode ser explicado principalmente pelos recolhimentos de ajuste do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

Malaquias, afirmou que o resultado da arrecadação de fevereiro foi muito satisfatório:

— Isso demonstra a adesão da arrecadação ao desempenho da atividade econômica.

O auditor ainda explicou que o Fisco aguarda o encerramento do trimestre para avaliar o desempenho das empresas, que representam parte relevante da arrecadação, já que março é o último mês para se fazer ajustes e haverá uma análise mais precisa, uma vez que em 2021 esses tributos foram responsáveis por um volume significativo de receitas extraordinárias.

Em fevereiro, o Fisco destacou o desempenho da arrecadação do IOF, que somou R$ 4,5 bilhões, um crescimento real de 26,28%, fruto do crescimento de operações de crédito, que influenciaram o IOF crédito para pessoas físicas e jurídicas, além de maior arrecadação em operações de câmbio.

A arrecadação do IRRF-Rendimentos de Capital somou R$ 5 bilhões em fevereiro, um crescimento real de 57,77% em relação ao mesmo mês do ano passado. A economista Juliana Damasceno destacou que esse crescimento reflete os maiores rendimentos de fundos e títulos de renda fixa, fruto da Selic, a taxa básica de juros, em alta.  O Banco Central vem elevando a Selic para frear a aceleração da inflação e atualmente está fixada em 11,75% ao ano.

A arrecadação de PIS/Cofins somou R$ 32 bilhões neste mês, um avanço de 6,68% em relação ao ano passado. O resultado é fruto do melhor desempenho do setor de serviços, a despeito da retração da indústria.