Publicado em 23/04/2018 17:06 Última edição 23/04/2018 17:06

E o impostômetro vem desde Tiradentes

Fonte: A Tribuna

E o impostômetro vem desde Tiradentes
Hoje se relembra a Inconfidência Mineira, revolta contra cobrança de impostos pela coroa; o tempo passou e os tributos só cresceram

DA REDAÇÃO

21 de abril. Todo ano se relembra essa data, que marca o dia em que um brasileiro, Joaquim José da Silva Xavier, foi morto pela coroa portuguesa. Tudo porque ele liderou uma manifestação, iniciada por conta da revolta contra os impostos a I nconfidênci a M i nei ra.

Na época, a coroa exigia ficar com o chamado “o quinto”, que era 20% de todo o ouro arrecadado. O Joaquim, de apelido Tiradentes, foi o único em julgamento que não negou pelo que lutava. Era o menos nobre entre os inconfidentes e foi enforcado e esquartejado. Hoje, 226 anos depois, não se paga mais um quinto, mas cerca de dois quintos, ou seja, 35% de impostos saem do bolso do brasileiro direto para o governo.

Até amanha, dia 22, os tributos pagos pelos brasileiros desde o primeiro dia do ano vão somar R$ 700 bilhões, segundo o Impostômetro, ferramenta criada pela Associação Comercial de São Paulo e lançada um dia antes do aniversário de morte de Tiradentes, em 20 de abril de 2005.

Se for feita uma divisão de dias de trabalho, um quinto do ano equivaleria a 73 dias de labuta para pagar impostos ao reino. Hoje, se trabalha 153 dias mais que o dobro que em 1792, quando Joaquim morreu.

Só o Estado de São Paulo já arrecadou, de 1de janeiro deste ano até ontem, cerca de R$ 28 bilhões, o que representa 37,39% do total do Pais. Ou seja, vivemos no estado onde mais se arrecada para o governo. Santos por exemplo arrecadou R$ 41 milhões até ontem (veja a lista completa).

CONVIVÊNCIA COM IMPOSTOS

Para Marcel Solimeo, economista da Associação Comercial de São Paulo, todo esse contexto histórico e os números calculados pela ferramenta mostram como o Brasil, há muito tempo, convive com os impostos.

“Hoje, se você colocar exatamente tudo na conta, se chega a quase 40%. Mas consideramos os dados oficiais, que mostram que pagamos entre 34% c 35% do Produto Interno Bruto (PIB), carga tributária muito alta se você considerar o nível de renda da população”, opina.

Segundo estudos, o valor ideal para o brasileiro pagar, mantendo o equilíbrio financeiro das famílias e da máquina, ficaria entre 24% e 25%, que é mais ou menos a carga de países com renda próxima, como o Chile além disso, o valor é mais parecido com o “quinto” exigido na época de Tiradentes em torno de um quarto do arrecadado pelas famílias.

Mesmo assim, o Brasil não é o país que mais cobra da população desde os tempos de Cabral. Suécia, Dinamarca, Finlândia, Alemanha e França, por exemplo, têm cargas tributárias superiores às do País do Futebol.

“Mas são países já desenvolvidos cujos impostos foram aumentados depois que já eram desenvolvidos e ricos, Nós ainda não chegamos nesse estágio. E eles devolvem o que é pago em serviços de qualidade”, aponta o economista.

Por aí, tem gente achando que faltam mais Tiradentes atuais e também tem nas ruas quem acredite que nem a presença de um mártir dê jeito na situação atual.

Para Solimeo, “se a população não se movimentar na eleição e depois dela, para cobrar ações, tudo vai continuar como está”, falou, lembrando que a proposta de reforma tributária está parada na Câmara. Ela não baixaria os impostos mas facilitaria a tributação, diminuindo sonegação.

“Tem muito cidadão humilde que não reclama, porque acha que não paga imposto por estar isento de IPTU e de declaração dc Imposto dc Renda. Não se dão conta que pagam na conta de luz mais de 40% de imposto embutido, no telefone e no material escolar também. Tudo o que ele compra no supermercado tem imposto e, muitas vezes, aceitam esses serviços precários como se fosse um favor do governo”, diz Solimeo.

HISTORIA

Douglas Souza Santos, professor de História no Ensino Médio do Liceu Santista e de Cubatão, explica que naquela época, o quinto de onde veio a expressão de mandar alguém para o quinto dos infernos era como era chamada a quinta parte que deveria ser enviada ao rei, de todo o ouro que fosse extraído no Brasil. Esse quinto se aplicava a todas as pessoas, mas na colônia se tornava abusivo, porque lá não se tinham as mesmas condições de vida que na metrópole. As coisas eram mais caras e não havia liberdade comercial. E a coroa portuguesa tinha um sistema de fiscalização eficiente. Passou a realizar uma cobrança forçada que era chamada "derrama". Quem não pagava, tinha seus bens recolhidos. Os inconfidentes tiveram muita ousadia. Eles promoveram uma reação à rigidez de Portugal. Tiradentes foi o líder, apesar de ser a pessoa com menor destaque social.Tinha inúmeros empregos: dentista, mascate, garimpeiro, fazia tudo isso para obter renda e foi o único que não negou sua participação no movimento. Depois que todos os inconfidentes foram presos e interrogados, Tiradentes foi o único punido com a morte".

PANORAMA NA REGIÃO E EVOLUÇÃO DO IMPOSTO

A Baixada Santista não paga mais impostos do q ue as demais regiões do Estado, pois os impostos são recolhidos de acordo com a renda e a riqueza gerada. Quem explica é Karla Simionato, economista e conselheira do Conselho Regional de Economia. "Por isso, o Estado de São Pauloacaba recolhendo mais, porque é o estado mais rico da Federação, é onde mais riqueza se produz, onde se gera mais renda e onde se consome mais bens e serviços", explica.

Também é errôneo pensarque há somente benefícios pela presença do polo petroquímico de Cubatão e pelo Porto na mesma região. "Em relação ao Porto, muito do arrecadado não fica para as cidades portuárias, como Santos e Guarujá. Isso é ruim para as cidades, porque se tira dinheiro delas. Já em Cubatão, as indústrias petroquímicas estão fechando cada vez mais. Até se paga menos impostos, mas a arrecadação municipal diminui com isso. Era muito alta em virtude das riquezas geradas pelas indústrias”, afirma a economista.

“Estão faltando vários Tiradentes, pois hoje com a situação que está, só um não daria conta. Hoje os Tiradentes vão para a rua, a polícia reprime e nada muda. Acho que só alguém no poder poderia mudar algo de cima para baixo”

 ATITUDES

“Hoje temos Tiradentes de menos, precisaríamos de mais na população em geral, lutando não com violência, mas com atitudes, porque a carga tributária no nosso País está muito alta. É quase 50%. Mas um Tiradentes moderno ia ter até mais coisas a lutar"

Marcelo Dias Gonçalves

50 anos, funcionário público